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O motivo de estarem chamando tudo de "meme" e a crise de analfabetismo funcional

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Está no Twitter? Não? É de lá que saiu o conceito das imagens geralmente cômicas com um espaço branco acima contendo uma frase de legenda, curta, que se tornou esse meme 2.0, essa piada à jato feita pra ser replicada e entendida rapidamente. "Quando eu faço sei lá o quê" e abaixo uma imagem que, inserida na situação, se torna engraçada. É justamente no esquema da piada, incluindo o esquema de sua estética, que esse meme se difere do outro meme. Na verdade "outros memes".


Esses outros memes eram dois: aqueles onde uma reação pré-definida pro quadrinho final, geralmente emocional, os "tipos de carinha"(Forever Alone, Rage Face, etc) e o jogo era encaixar algo nos três primeiros quadrinhos que dessem sentido aquilo. A outra corrente desse meme 1.0 era aquela que se tornou os "Advice Animals" (Como por exemplo a do Awkward Penguin, onde a piada deveria retratar uma situação constrangedora). Nesse caso, a imagem dava um contexto pra uma piada que deveria ter duas frases. Exatamente o mesmo jogo da primeira corrente, só que invertido: em um está na legenda, no outro está no contexto. Veja como pareço estar falando sobre três correntes aqui, e as três você chama de meme. Não são um tanto diferentes? Acho que deveriam ter nomenclaturas diferentes também, bem como as correntes artísticas (parecem se comportar do mesmo jeito).

No caso dos Advice Animals, me parece um jogo de humor bruto. Essa característica de te restringir bastante com duas regras (ESSA SITUAÇÃO + DUAS FRASES) só te dá a chance de jogar a punchline nua e crua ali. No caso da corrente dos "tipos de carinha" (como muitos chamam), havia mais liberdade pro autor, sendo que a restrição ali era se adequar a emoção final em 3 três quadrinhos, podendo movimentar personagens, colocar falas e elementos externos (uma característica também era que o desenho fosse tosco, geralmente feito nas coxas com o paint¹).

Essa onda que surge agora com a popularização de recortes de tweets em outras redes sociais, tendo muita aceitação (e muita gente nem sabe o que é Twitter) tem as características de um tweet mesmo, devem ser humorísticas (afinal, era por isso que eram compartilhados no facebook) e são acompanhados de uma imagem, que dá metade da sustentação à piada. Agora o desafio é nas duas partes: você deve criar uma legenda qualquer e escolher qualquer imagem. A frase deve ser curta e deve se sustentar como uma casinha binária de cartas com a imagem.

O que eu tô querendo dizer ao sugerir que erroneamente nomearam erroneamente de "memes" correntes diferentes de algo maior (justamente a categoria "meme" que os une), colocando três ou mais delas no mesmo saco? Estou dizendo que tem bastante coisa pra ser vista aí. Creio que se trata de uma forma de arte humorística e coletiva, com suas respectivas correntes e leis. Observando isso, poderemos encontrar respostas sobre como nos comportamos e somos coletivamente em várias e várias coisas. Leis sociais que são tão absolutas quanto a lei da gravidade, sabe? Esse erro semântico caracteriza uma falta de entendimento do Real. Estou usando esse exemplo bobo mas ele pode ser aplicado pra várias coisas: quando uma pessoa não chega na essência das palavras, se apega à sua aparência, e logo as distorções começam, já que, a essência sendo guia da palavra e a aparência sua representação "material", o modo como as palavras se formam na cabeça só pode ser por associação. Esse método de "associar para falar", quando inserido na mente de milhões de pessoas, começa a provocar distorções coletivas dos significados das palavras, como se uma malha de mentira entrasse no entendimento de realidade humano por comum acordo. Esse não-atingir-a-essência, coisa que uma cognição saudável faz, é que leva 50% dos estudantes brasileiros a serem analfabetos funcionais. Não creio que metade de nossos estudantes tenham um QI abaixo da média mundial. Acho que capacidades cognitivas básicas, como essa de perceber a essência das palavras, estão sendo destruídas logo na infância. Logo na escola. É assustador. Reflita.

1 - depois que foi tomando outra forma, fizeram versões HD desses rostos propositalmente toscos, muitos quadrinhos e humor cada vez mais decadente. Como sempre, é a vontade de vender que mata a arte. Não que seja imoral o artista colocar um preço em sua arte, como um cantor faz com seu disco. Não há nada de errado nisso. Acontece que, no que parece ser um processo natural de uma corrente espontânea assim, seguindo alguma lei, há uma taxa de pessoas que começam a produzir aquilo apenas com o intuito de gerar alguma renda com aquilo. Em certo momento essa taxa de pessoas calculistas é maior do que as pessoas que fazem com talento, porque gostam, e porque é verdadeiro. Isso acontece na arte também. Um movimento em ascensão se torna rapidamente alvo de investimentos exatamente desse tipo de pessoa. As coisas do coração quando feitas com o raciocínio morrem por dentro e perdem o sentido. Claro, existem várias dessas pessoas que conseguem agradar muitas pessoas, mas audiência não é o que define a boa arte. De um jeito ou de outro, sem entrar no mérito do que é ou não Arte, a boa arte enaltece a corrente a qual participa. A má arte a mata, de um jeito ou de outro. Pode parecer pedante colocar uma nota de rodapé num texto de site de humor, mas é que abri parênteses e percebi que ficaria grande, como ficou.



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